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Mostrando postagens de 2010

Tententender Pouca Vogal Composição: Duca Leindecker / Humberto Gessinger

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Se eu disser que vi rastejar A sombra do avião feito cobra no chão Tententender minha alegria A sombra mostrou o que a luz escondia Se eu quiser ser mais direto Vou me perder melhor deixar quieto Tententender, tentenxergar O meu olhar pela janela do avião Que amor era esse Que não saiu do chão? Não saiu do lugar Só fez rastejar o coração Se eu disser que tive na mão A bola do jogo, não acredite Tententender minha ironia Se eu disser que já sabia O jogo acabou de repente O céu desabou sobre a gente Tententender, quero abrigo E não consigo ser mais direto Que amor era esse Que não saiu do chão? Não saiu do lugar Só fez rastejar o coração

Olhos Nos Olhos - Chico Buarque

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Quando você me deixou, meu bem Me disse pra ser feliz e passar bem Quis morrer de ciúme, quase enlouqueci Mas depois, como era de costume, obedeci Quando você me quiser rever Já vai me encontrar refeita, pode crer Olhos nos olhos Quero ver o que você faz Ao sentir que sem você eu passo bem demais E que venho até remoçando Me pego cantando, sem mais, nem por quê Tantas águas rolaram Quantos homens me amaram Bem mais e melhor que você Quando talvez precisar de mim Cê sabe que a casa é sempre sua, venha sim Olhos nos olhos Quero ver o que você diz Quero ver como suporta me ver tão feliz

Para Viver Um Grande Amor - Vinicius de Moraes

Composição: Vinicius de Moraes / Toquinho Cantado Eu não ando só Só ando em boa companhia Com meu violão Minha canção e a poesia Falado Para viver um grande amor, preciso É muita concentração e muito siso Muita seriedade e pouco riso Para viver um grande amor Para viver um grande amor, mister É ser um homem de uma só mulher Pois ser de muitas - poxa! - é pra quem quer Nem tem nenhum valor Para viver um grande amor, primeiro É preciso sagrar-se cavalheiro E ser de sua dama por inteiro Seja lá como for Há de fazer do corpo uma morada Onde clausure-se a mulher amada E postar-se de fora com uma espada Para viver um grande amor Cantado Eu não ando só, Só ando em boa companhia Com meu violão Minha canção e a poesia Falado Para viver um grande amor direito Não basta apenas ser um bom sujeito É preciso também ter muito peito Peito de remador É sempre necessário ter em vista Um crédito de rosas no florista Muito mais, muito mais que na modista Para viver um grande amor Conta ponto saber fazer c

Desencanto - Manuel Bandeira

Eu faço versos como quem chora De desalento... de desencanto... Fecha o meu livro, se por agora Não tens motivo nenhum de pranto. Meu verso é sangue. Volúpia ardente... Tristeza esparsa... remorso vão... Dói-me nas veias. Amargo e quente, Cai, gota a gota, do coração. E nestes versos de angústia rouca, Assim dos lábios a vida corre, Deixando um acre sabor na boca. Eu faço versos como quem morre.

Chapeuzinho Vermelho - Millôr Fernandes

Era uma vez (admitindo-se aqui o tempo como uma realidade palpável, estranho, portanto, à fantasia da história) uma menina, linda e um pouco tola, que se chamava Chapeuzinho Vermelho. (Esses nomes que se usam em substituição do nome próprio chamam-se alcunha ou vulgo). Chapeuzinho Vermelho costumava passear no bosque, colhendo Sinantias, monstruosidade botânica que consiste na soldadura anômala de duas flores vizinhas pelos invólucros ou pelos pecíolos, Mucambés ou Muçambas, planta medicinal da família das Caparidáceas, e brincando aqui e ali com uma Jurueba, da família dos Psitacídeos, que vivem em regiões justafluviais, ou seja, à margem dos rios. Chapeuzinho Vermelho andava, pois, na Floresta, quando lhe aparece um lobo, animal selvagem carnívoro do gênero cão e... (Um parêntesis para os nossos pequenos leitores — o lobo era, presumivelmente, uma figura inexistente criada pelo cérebro superexcitado de Chapeuzinho Vermelho. Tendo que andar na floresta sozinha, - natural seria que, vo

Desgracida

O professor de Letras da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e tradutor Caetano W. Galindo faz uma resenha, em formato de car­­ta, sobre Desgracida, o recém-lançado livro de Dalton Trevisan, sucessor de Violetas e Pavões (2009). Caro senhor Dalton Trevisan, Esse teu Desgracida é uma preciosidade. A primeira leitura, afogada, ansiosa, deu, mera, meia hora. Texto concentrado, esmirradinho e forte toda-vida, aquelas epifanias breves. Uma por página. Cada uma um coração de alcachofra. Mas foi primeira. Já voltei, lendo lento, e ainda hei. Que, ah!, merece... (Afinal, mesmo você soltando um por ano, dá pra sentir falta.) É um tipo de conforto e um grande deslumbre rever a cada novo o mesmo povo, a mesma voz, mesma “pegada”, mas sempre relida, apontada pra uns cantos novos, sussurando outros temas, bundas outras, mais velhinhos sujos, pivetinhos petulantes. É ver um grande bluesman, tirando mais música da estrutura estreita, fazendo o mesmo, incontornável, mas fazendo sempre como pela prim

Ser mãe

SER MÃE A missão de ser mãe quase sempre começa com alguns meses de muito enjôo, seguido por anseios incontroláveis por comidas estranhas, aumento de peso, dores na coluna, o aprimoramento da arte de arrumar travesseiros preenchendo espaços entre o volume da barriga e o resto da cama. Ser mãe é não esquecer a emoção do primeiro movimento do bebezinho dentro da barriga. O instante maravilhoso em que ele se materializou ante os seus olhos, a boquinha sugando o leite, com vontade, e o primeiro sorriso de reconhecimento. Ser mãe é ficar noites sem dormir, é sofrer com as cólicas do bebê e se angustiar com os choros inexplicáveis: será dor de ouvido, fralda molhada, fome, desejo de colo? É a inquietação com os resfriados, pânico com a ameaça de pneumonia, coração partido com a tristeza causada pela morte do bichinho de estimação do pequerrucho. Ser mãe é ajudar o filho a largar a chupeta e a mamadeira. É levá-lo para a escola e segurar suas mã

A via Crucis do Corpo - Clarice Lispector - Ruído de Passos

Tinha oitenta e um anos de idade. Chamava-se dona Cândida Raposo. Essa senhora tinha a vertigem de viver. A vertigem se acentuava quando ia passar dias numa fazenda: a altitude, o verde das arvores, a chuva, tudo isso a piorava. Quando ouvia Liszt se arrepiava toda. Fora linda na juventude. E tinha vertigem quando cheirava profundamente uma rosa. Pois foi quando dona Cândida Raposo que o desejo de prazer não passava. Teve enfim a grande coragem de ir a um ginecologista. E perguntou-lhe envergonhada, de cabeça baixa: - Quando é que passa? - Passa o quê, minha senhora? - A coisa. - Que coisa? - A coisa, repetiu. O desejo de prazer, disse enfim. - Minha senhora, lamento lhe dizer que não passa nunca. Olhou- o espantada. - Mas eu tenho oitenta e um anos de idade! - Não importa, minha senhora. É até morrer. - Mas isso é o inferno! - É a vida, senhora Raposo. A vida era isso, então? Essa falta de vergonha? - E o que é que eu faço? Ninguém me quer mais... O médico olhou-a com piedade. - Não h

Miguel Sanches Neto x Dalton Trevisan (pelejas)

O conflito entre os dois escritores começou quando os originais de Chá das cinco com o vampiro, de Sanches Neto, chegou às mãos de Trevisan. Agora, Sanches Neto declara: “O livro não tinha sido sequer publicado e, mesmo assim, eu já tinha sido agressivamente atingido. Passei todo esse tempo na defensiva. Mas acho que cansei de ser atacado.” O livro agora sai pela editora Objetiva. Leia o texto completo aqui: Fala serena e tímida, o escritor paranaense Miguel Sanches Neto, 45, tem, como Trevisan, o “vampiro de Curitiba”, um quê de esquivo. Deseja dar entrevista sobre “Chá das Cinco com o Vampiro”, mas, ao mesmo tempo, mede com cautela cada uma das palavras. As primeiras perguntas são respondidas por e-mail. E é apenas ao telefone que admite: “O livro não tinha sido sequer publicado e, mesmo assim, eu já tinha sido agressivamente atingido. Passei todo esse tempo na defensiva. Mas acho que cansei de ser atacado”. Sanches, autor de livros como “Chove sobre Minha Infância” e “Um Am

CONTRIBUIÇÕES DO MÉTODO RECEPCIONAL PARA A LEITURA LITERÁRIA NA ESCOLA

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1 Ana Paula Miqueletti SANCHES (Universidade Estadual de Londrina – PG – CAPPES) Essa comunicação objetiva evidenciar a importância da leitura literária na escola e enfatizar como o Método Recepcional, proposto por Bordini e Aguiar (1988), pode contribuir para a ampliação do horizonte de expectativas do leitor. No entanto, para isso, faz-se necessário adentrar, mesmo que rapidamente, nas teorias de Hans Robert Jauss sobre a Estética da Recepção. Na Universidade de Constança, em 1967, Hans Robert Jauss, abriu o semestre letivo com uma palestra denominada: O que é e com que fim se estuda a história da literatura, a qual, posteriormente, teve seu nome trocado por: A história da literatura como provocação à crítica literária. A partir disso, o estudioso alemão, publicou inúmeras obras que discutiam o lugar da literatura nos estudos literários. Jauss colocou-se contra a separação entre história e estética e propôs, então, um diálogo entre elas, fazendo surgir em plano de destaque o leitor,

Obrigada Patty, lindo texto!

Certezas Não quero alguém que morra de amor por mim... Só preciso de alguém que viva por mim, que queira estar junto de mim, me abraçando. Não exijo que esse alguém me ame como eu o amo, quero apenas que me ame, não me importando com que intensidade. Não tenho a pretensão de que todas as pessoas que gosto, gostem de mim... Nem que eu faça a falta que elas me fazem, o importante pra mim é saber que eu, em algum momento, fui insubstituível... E que esse momento será inesquecível... Só quero que meu sentimento seja valorizado. Quero sempre poder ter um sorriso estampando em meu rosto, mesmo quando a situação não for muito alegre... E que esse meu sorriso consiga transmitir paz para os que estiverem ao meu redor. Quero poder fechar meus olhos e imaginar alguém...e poder ter a absoluta certeza de que esse alguém também pensa em mim quando fecha os olhos, que faço falta quando não estou por perto. Queria ter a certeza de que apesar de minhas renúncias e loucuras, alguém me valoriza pelo que

Análise de Dom Casmurro de Machado de Assis

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INTRODUÇÃO Maior escritor brasileiro de todos os tempos, Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) era um mestiço de origem humílima, filho de um mulato e de um lavadeira portuguesa dos Açores. Moleque de morro, magro, franzino e doentio, o maior escritor brasileiro se fez sozinho, adquirindo a sua vasta e espantosa cultura de forma inteiramente autoditada. Ao estudar a obra de Machado de Assis, a crítica divide-a em duas fases bem distintas cujo marco deliminatório é o romance Memórias Póstumas de Brás Cubas publicado em 1881. Até essa data, a obra machadiana é marcante romântica, e nela sobressai poesia, conto e romances como Ressurreição (1872), A mão e a luva (1874), Helena (1876) e Iaiá Garcia (1878). Tais obras pertencem pois, à chamada primeira fase. A partir de 1881, com a publicação das Memórias, Machado de Assis muda de tal forma que Lúcia Miguel Pereira, biógrafa e estudiosa do escritor, chega a afirmar que "tal obra não poderia ter saído

MARABÁ - GONÇALVES DIAS

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Eu vivo sozinha; ninguém me procura! Acaso feitura Não sou de Tupá? Se algum dentre os homens de mim não se esconde, — Tu és, me responde, — Tu és Marabá! — Meus olhos são garços, são cor das safiras, — Têm luz das estrelas, têm meigo brilhar; — Imitam as nuvens de um céu anilado, — As cores imitam das vagas do mar! Se algum dos guerreiros não foge a meus passos: "Teus olhos são garços, Responde anojado; "mas és Marabá: "Quero antes uns olhos bem pretos, luzentes, "Uns olhos fulgentes, "Bem pretos, retintos, não cor d'anajá!" — É alvo meu rosto da alvura dos lírios, — Da cor das areias batidas do mar; — As aves mais brancas, as conchas mais puras — Não têm mais alvura, não têm mais brilhar. — Se ainda me escuta meus agros delírios: "És alva de lírios", Sorrindo responde; "mas és Marabá: "Quero antes um rosto de jambo corado, "Um rosto crestado "Do sol do deserto, não flor de cajá." — Meu colo de leve se encurva engraç

Pseudônimo de Fernando Pessoa

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Álvaro de Campos Todas as Cartas de Amor são Ridículas Todas as cartas de amor são Ridículas. Não seriam cartas de amor se não fossem Ridículas. Também escrevi em meu tempo cartas de amor, Como as outras, Ridículas. As cartas de amor, se há amor, Têm de ser Ridículas. Mas, afinal, Só as criaturas que nunca escreveram Cartas de amor É que são Ridículas. Quem me dera no tempo em que escrevia Sem dar por isso Cartas de amor Ridículas. A verdade é que hoje As minhas memórias Dessas cartas de amor É que são Ridículas.

FeLiCiDaDe....

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Não se acostume com o que não o faz feliz, revolte-se quando julgar necessário. Alague seu coração de esperanças, mas não deixe que ele se afogue nelas. Se achar que precisa voltar, volte! Se perceber que precisa seguir, siga! Se estiver tudo errado, comece novamente. Se estiver tudo certo, continue. Se sentir saudades, mate-a. Se perder um amor, não se perca! Se o achar, segure-o! Fernando Pessoa

Lilás - Djavan

Amanhã Outro dia Lua sai Ventania abraça Uma nuvem que passa no ar Beija Brinca E deixa passar E no ar De outro dia Meu olhar Surgia nas pontas De estrelas perdidas no mar Pra chover de emoção Trovejar... Raio se libertou Clareou Muito mais Se encantou Pela cor lilás Prata na luz do amor Céu azul Eu quero ver O pôr do sol Lindo como ele só E gente pra ver E viajar No seu mar De raio.

SE - HAROLDO DE CAMPOS - Poesia Concreta

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Casamento

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“CASAMENTO” O casamento é constituído de um eterno conquistar... Começa bem cedinho... Antes mesmo do acordar... Sonhos lindos de carinho... Para o seu amor agradar!!! A metade da bala... Uma pétala de flor... Uma simples palavra... Eu te amo meu amor!!! Metade do ar que respiras... Pertence a teu bem... Não pode existir nesta vida... Alguém que você queira tão bem!!! A cumplicidade... O companheirismo... A amizade... O respeito mutuo!!! Não se casa sem ser acasalados... Duas metades com interesses irmanados... Dois sonhos com o mesmo ideal... Duas vidas com um caminho triunfal!!! Conquistas solidárias... Partilhas somatórias... Projetos uníssonos... Soma de todos os sonhos!!! Entrega constante... Para um eterno receber... Indivisível sentimento dominante... No universo colorido do prazer!!! Este é o casal, a dualidade coagulada... A singularidade plural... O mesmo trecho da estrada... Que leva ao amor universal!!! O verso e reverso da moeda... Em um constante dar e receber... O casal,

Quem se arrisca? NELSON RODRIGUES

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Flor de Obsessão Nelson Rodrigues - O adulto não existe. O homem é o menino perene. - Sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino. E o buraco da fechadura é, realmente, a minha ótica de ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico. - A perfeita solidão há de ter pelo menos a presença numerosa de um amigo real. - Amar é ser fiel a quem nos trai. - Toda autocrítica tem a imodéstia de um necrológio redigido pelo próprio defunto. - Só acredito na bondade que ri. Todo santo devia ser jucundo como um abade da Brahma. - O brasileiro é um feriado. - Os jardins de Burle Marx não têm flores. Têm gramados e não flores. Mas para que grama, se não somos cabras? - A burrice é a pior forma de loucura. - No Brasil quem não é canalha na véspera é canalha no dia seguinte. O Otto Lara está certo. O mineiro só é solidário no câncer. - O carioca é o único sujeito capaz de berrar confidências secretíssimas de uma calçada para outra

VOCÊ ESTÁ MORRENDO?

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Quem morre? Morre lentamente quem não viaja, quem não lê, não ouve música, quem não encontra graça em si mesmo. Morre lentamente quem destrói o seu amor-próprio, quem não se deixa ajudar. Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito, repetindo todos os dias os mesmos trajetos, quem não muda de marca, não se arrisca a vestir uma nova cor ou não conversa com quem não conhece. Morre lentamente quem evita uma paixão, quem prefere o negro sobre o branco e os pontos sobre os "is" em detrimento de um redemoinho de emoções justamente as que resgatam o brilho dos olhos, sorrisos dos bocejos, corações aos tropeços e sentimentos. Morre lentamente quem não vira a mesa quando está infeliz com seu trabalho, quem não arrisca o certo pelo incerto para ir atrás de um sonho, quem não se permite pelo menos uma vez na vida fugir dos conselhos sensatos. Morre lentamente quem passa os dias queixando-se da sua má sorte ou da chuva incessante. Morre lentamente quem abandona um projeto an

Epifânica!!!

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Felicidade clandestina - Clarice Lispector Ela era gorda, baixa, sardenta e de cabelos excessivamente crespos, meio arruivados. Tinha um busto enorme, enquanto nós todas ainda éramos achatadas. Como se não bastasse, enchia os dois bolsos da blusa, por cima do busto, com balas. Mas possuía o que qualquer criança devoradora de histórias gostaria de ter: um pai dono de livraria. Pouco aproveitava. E nós menos ainda: até para aniversário, em vez de pelo menos um livrinho barato, ela nos entregava em mãos um cartão-postal da loja do pai. Ainda por cima era de paisagem do Recife mesmo, onde morávamos, com suas pontes mais do que vistas. Atrás escrevia com letra bordadíssima palavras como "data natalícia" e "saudade". Mas que talento tinha para a crueldade. Ela toda era pura vingança, chupando balas com barulho. Como essa menina devia nos odiar, nós que éramos imperdoavelmente bonitinhas, esguias, altinhas, de cabelos livres. Comigo exerceu com calma ferocidade o seu sadis

Carlos Drummond de Andrade sobre as MÃES

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Para Sempre Por que Deus permite que as mães vão-se embora? Mãe não tem limite, é tempo sem hora, luz que não apaga quando sopra o vento e chuva desaba, veludo escondido na pele enrugada, água pura, ar puro, puro pensamento. Morrer acontece com o que é breve e passa sem deixar vestígio. Mãe, na sua graça, é eternidade. Por que Deus se lembra - mistério profundo - de tirá-la um dia? Fosse eu Rei do Mundo, baixava uma lei: Mãe não morre nunca, mãe ficará sempre junto de seu filho e ele, velho embora, será pequenino feito grão de milho.

A Menina de Lá - João Guimarães Rosa

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Sua casa ficava para trás da Serra do Mim, quase no meio de um brejo de água limpa, lugar chamado o Temor-de-Deus. O Pai, pequeno sitiante, lidava com vacas e arroz; a Mãe, urucuiana, nunca tirava o terço da mão, mesmo quando matando galinhas ou passando descompostura em alguém. E ela, menininha, por nome Maria, Nhinhinha dita, nascera já muito para miúda, cabeçudota e com olhos enormes. Não que parecesse olhar ou enxergar de propósito. Parava quieta, não queria bruxas de pano, brinquedo nenhum, sempre sentadinha onde se achasse, pouco se mexia. – "Ninguém entende muita coisa que ela fala..." – dizia o Pai, com certo espanto. Menos pela estranhez das palavras, pois só em raro ela perguntava, por exemplo: - "Ele xurugou?" – e, vai ver, quem e o quê, jamais se saberia. Mas, pelo esquisito do juízo ou enfeitado do sentido. Com riso imprevisto: - "Tatu não vê a lua..." – ela falasse. Ou referia estórias, absurdas, vagas, tudo muito curto: da abelha